CAMANDUCAIA - Histórias de Ricardina Fernandes
Cassalho
Ricardina
Fernandes Cassalho, nascida em 1866, era filha do abastado Domingos Fernandes
Cassalho e de Escolástica Bernardina de Sene, cujo casamento e nascimento não
foram encontrados nos livros de Camanducaia (antiga Jaguary de Minas), que
datam desde 1779, sabe-se no entanto que
o casal possuía muitas posses, quer sejam em terras ou escravos.
Ricardina
ao contrário de muitas mulheres de sua época era pessoa que sabia ler e escrever, tendo o mesmo talhe
de letra de seu pai. Dele deve ter adquirido outras características, tais como
a ousadia e a teimosia. Mulher alta,
esbelta, de sobrancelhas cerradas e pulso firme, características essas passadas
as suas futuras gerações.
Aos
dezessete anos de idade, no ano de 1883, casou-se com Joaquim Alves de Souza, nascido Santo Antonio da Cachoeira, (hoje Piracaia) em 1843, filho de José
Antonio de Oliveira (falecido em Piracaia em 05/1/1849) e de Anna Joaquina, constituindo o casal um ótimo
patrimônio, no lugar hoje conhecido como bairro do Azevedo e Bonifácios.
O
casal teve ao todo nove filhos, sendo que todos receberam o sobrenome Cassalho
como sucessão de sobrenome, sendo que o “Alves de Souza” ficou em segundo plano
ou mesmo desapareceu por completo. Graças a esta atitude e ao costume de se
manter o sobrenome de maior importância, foi possível perpetuar o sobrenome
Cassalho às gerações futuras; se assim não fosse o mesmo teria desaparecido
entre os inúmeros Sousas de nosso País.
Seu
pai Domingos Fernandes Cassalho, faleceu em 14/6/1885 e sua esposa dona Escolástica Bernardina
faleceu em 19/07/1911, com mais de oitenta anos, vitima de queimaduras, no
bairro da Pinguela, em Camanducaia.
Neste período inicia-se uma vida difícil para Ricardina, dado ao endosso
de dívidas feitas por seu marido e a diversas crises econômicas que o País
atravessou no inicio do século XX. O
casal começa a perder grande parte de seu patrimônio, bem como a não receber
muitas das dividas de capital emprestado a terceiros. Associa-se a tudo isso a
doença de seu marido, ou seja, problemas de fígado, o qual se agrava e o mesmo vem a falecer em 24/09/1911, aos 58
anos de idade. Viuva aos 45 anos e mãe de nove filhos, dos quais poucos tinham
casado e constituído família, Ricardina assume a chefia familiar e passa a exercer o oficio de
parteira.
Em
1914 casa-se com o viuvo João Antonio da Cruz, porém esse casamento foi
desastroso, não durando um ano, a mesma resolve, contrariando os princípios da
época, separar-se deu seu segundo marido, indo residir definitivamente em Camanducaia,
na casa de seu filho Cipriano Fernandes Cassalho. João Antonio da Cruz faleceu
em 24/08/1917, com setenta anos de idade.
Continua
nesse período no seu oficio de parteira, montava em seu cavalo como se fosse um
homem, usando inclusive calças masculinas para facilitar a montaria, atendendo diversos bairros. Conta-se que certa feita, voltando após um
parto encontrou um aglomerado de pessoas
na estrada, e viu tratar-se de um cavaleiro que havia caído de seu cavalo e
feito grande corte na barriga; imediatamente levou o homem para uma casa ali
próximo, desinfetou uma agulha no fogo, lavou bem o corte com água fervida e
passou a costurá-lo, enfaixando-o em seguida e dando-lhe algumas ervas de seu
conhecimento. Neste período não existiam médicos na região e o transporte para
longe poderia causar a morte do mesmo. Semanas depois ao passar pela região,
Ricardina foi informada que o moço passava bem. Na verdade seu filho João
Cassalho, conhecido como João Peludo, seguiu o oficio de curandeiro, sendo muito
procurado por seus poderes psíquicos e seu conhecimento sobre plantas
medicinais, recebendo então o apelido de João Curador. Segundo consta a irmã de
Ricardina também era conhecida pelos seus dons mediúnicos, sendo que muitos
membros da família até hoje se dedicam ou possuem alguns dons ou atividades
ligados a tais assuntos.
Conta-se
ainda que Ricardina era pessoa muito prendada, fazia desde crivo, bróias
(abrolhos) e de roupas velhas confeccionava roupas para crianças
recém-nascidas, as quais levava quando ia fazer parto de pessoas carentes e em
muitos casos, ao invés de receber a paga, ela era quem levava o costumeiro
frango para a dieta da parturiente. Pessoa
resoluta, estava sempre a frente dos negócios da família, alegre como
sempre porém de gênio bastante forte . Conta ainda que certa noite voltando de um parto, montada à cavalo, um
sujeito a desrespeitou, a mesma encurralou ele com o cavalo e nos dizeres da
época labrou o sujeito no chicote.
Finalmente
em 03/10/1933, Ricardina viria a falecer vitima de derrame. Seu corpo após o
preparo do caixão (nesta época a maioria eram sepultadas em redes ou lençóis,
os ditos bangues) e confeccionada e vestida a mortalha, posto sapatos, passou pela
igreja matriz onde foi encomendada sua alma e seu corpo foi exposto no pátio da
igreja, enfeitado com ramos, o mesmo foi fotografado e diversas fotografias
foram distribuídas a membros da família, em seguida em grande cortejo foi
sepultada no cemitério de Camanducaia. Tais fotografais são guardadas pela
família com grande carinho até hoje.
Ricardina
foi uma dessas mulheres que não só marcaram sua época, mas deixou sua presença
marcante, quer seja em traços e
personalidades em sua família. Curioso que até hoje, netos, bisnetos e
tataranetos, mesmo não tendo a conhecido, referem-se a ela com grande carinho e
respeito, devido a tão boas histórias que chegaram até nós a seu respeito.
VALTER CASSALHO, formado em História,
pesquisador, jornalista e morador da cidade de Joanópolis-SP. (Foto de dona Ricardina – acervo de seu neto
FELICIO DE SOUZA CASSALHO – meu avô materno em Joanópolis).
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