A lenda de Ituí
Era
noite. No manto negro do céu as estrelas eram engolidas por algumas nuvens,
soprava o vento como um prenúncio de tempestade. No alto da montanha uma
fogueira crepitante e um velho bugre cantava aos espíritos de seus ancestrais a
lenda da formação de sua terra. Interrompido por um pequeno curumim que trazia
mais lenha a fogueira, o velho começou a falar: “-Num tempo distante ao nosso,
mesmo antes de nossos ancestrais chegarem, existiu uma raça de gigantes. Foi no tempo da ordenação das estrelas e do
feitio do brilho da lua. Esses seres
eram fantásticos, e entre eles se destacava o bravo guerreiro Itaguará, o qual
defendia este torrão com todas as suas forças, sua voz era o trovão que fazia
estremecer toda a terra, era conhecido como o Senhor do Poente, onde se deitava
o sol e abria-se a cortina da noite. Voava ele numa gigantesca borboleta
bordada com os raios do sol.
Neste
período nasceu da grande Mãe-Terra a linda Ituí, rainha das espumas das águas,
senhora dos contornos da terra. Ituí inicia seu trabalho cortando vales e
montanhas, decorando pedras, deixando pelo seu caminho um rastro de ouro e de
vida. Todas as noites Ituí cantava a
margem dos rios, seguida de lindas Iaras, distribuindo presentes do fundo da
Terra às Mães d’Ouro. Porém um dia Ituí
vendo a estrela da manhã resolveu cantar para a mesma. Passava neste momento o
forte Itaguará, que ficou encantado com a beleza do canto e resolveu verificar
de onde vinha. Quando olhou para a bela Ituí, ficou perplexo por tanta beleza,
brilho e esplendor. Ituí assustada, mas também fascinada, mergulhou nas entranhas da Terra e lá
permaneceu até a lua cheia. Itaguará
todos os dias sobrevoava o local a sua procura, porém nem as Iaras, nem as Mães
d’Ouro sabiam de Ituí.
Durante
a lua cheia, Itaguará ouviu o lindo canto de Ituí e envolto num manto dourado
como Mãe d’Ouro aproximou-se de Ituí e pode ouvir por horas o seu canto.
Despindo-se pediu a Ituí que não fugisse e ela pode contemplar a beleza do corpo
de Itaguará. Nasce daí um grande amor entre os dois e ambos passam a voar
durante o dia fazendo a chuva e à noite
deslizavam pelos morros criando o rumor
das cachoeiras.
Porém,
Tataitá, o Senhor da Pedra do Fogo, guardião do Reino das Trevas, dos Vendavais e dos Feiticeiros, conhece a Ituí e por ela
também se apaixona. Mas, Ituí nada
queria com Tataitá, e este enraivecido trouxe a grande tempestade, e derrubou
Itaguará e arrebatou Ituí para a Gruta
Encantada.
Desesperado,
Itaguará procurou sua amada por todos os cantos, temendo que Tataitá tivesse
levado Ituí para o reino das Trevas, de onde ninguém pode sair. Inconformado,
procurou o grande feiticeiro Karmoitá o sentinela da morada do sol. Karmoitá
informou que Ituí estava na Gruta Encantada. Ambos então partiram para a Gruta
Encantada, onde mora Itatinga, o homem da Pedra Branca, e este informou que
aquele que ali entrasse não poderia sair sem deixar uma parte de seu ser, e
somente Tataitá poderia fazer a oferenda, pois fora ele mesmo que a conduziu
com ventos ao fundo da Gruta.
Irado, Itaguará foi a busca de Tataitá e ambos
iniciaram uma grande luta da qual Itaguará foi o vencedor. Forçado, Tataitá foi
a Gruta Encantada para soltar Ituí, mas como vingança ofereceu a Itatinga o
coração da mesma. Não podendo mais amar, Ituí foi para o alto do Morro e se
jogou num precipício. Itaguará desesperado partiu para o poente onde se deitou
esperando a morte ao lado da borboleta gigante.
Karmoitá
convocou os poderes de Tupã, o grande deus, e este puniu Tataitá a ficar Selado
na grande Pedra que guarda o reino dos Mortos, e, sabendo que os gigantes não
devem morrer, transformou Ituí na grande Cachoeira que incessantemente vasculha
a terra em busca de seu coração. Em
seguida, adormeceu Itaguará e a grande
borboleta, cobrindo-os com o manto da
Mantiqueira, surgindo assim o Gigante Adormecido e o Vale da Borboleta, de onde
pode ser visto sua amada, até o dia em que Itatinga devolva o coração de Ituí.
Karmoitá
foi para sua morada, de onde ouve o canto triste e monótono da Cachoeira e o
bater do coração de Ituí que vive cheio de saudades na Gruta Encantada”.
Valter Cassalho- 12/03/1997
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