segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

MILHO – UMA DÁDIVA DOS DEUSES
“-Xiiiii! Cumpadre, esse nem com mio benzido!” Esta é uma das frases comuns, quando se tenta pegar alguém para alguma coisa e o dito cujo é mais liso que bagre ensaboado. Mas porque o milho benzido? Bem, o milho era utilizado como isca nas peneiras, arapucas, laços e anzóis para a caça de pássaros e cevas de peixes; para melhorar a sorte dos caçadores e pescadores, o milho muito das vezes era benzido por benzedores ou ainda enfiados no bolso durante a benção da missa e nada melhor que um milho bento para se pegar coisas ariscas. O milho faz parte da cultura popular brasileira e graças a cultura indígena hoje ele é consumido mundialmente. Nativo das Américas, sendo parte integrante das comunidades nativas pré-colombianas, as quais de acordo com suas tribos criaram inúmeras lendas sobre sua origem. No Brasil, entre os guaranis o milho tem origem em dois guerreiros, que exaustos da procura de alimentos, encontraram um enviado de Nhandeiara (o grande espírito) que propôs a luta até morte entre os dois, avisando que do corpo daquele que morresse nasceria uma planta que alimentaria todo o mundo. Na luta sucumbiu o guerreiro Avanti e da sua sepultura nasceu o milho (chamado entre os tupis de Abati). Com a vinda dos espanhóis e portugueses o milho foi levado para a Europa e se espalhou pelo mundo todo. Entre muitas culturas pré-colombianas é tido como uma planta sagrada, ligada ao sol e a fartura. Herança dos índios, os brasileiros adotaram o milho em inúmeras formas, na culinária e no trato para os animais.
Na região caipira o milho é planta obrigatória das roças, no período que iniciam as chuvas são plantados, quando saem as primeiras espigas e iniciam a granação tem-se a boneca do milho, alegria do lavrador e das crianças que apanhavam algumas para brincar. Depois quando os cabelos ficam escuros e murcham é hora de reunir a família ou vizinhos e fazer a pamonha, que por ser muito trabalhosa acaba tornando-se um momento de reunião familiar e de lazer, nesta época surgem os bolos, curais, bolinhos, espigas assadas, cozidas e toda sorte de aproveitamento. Após alguns dias as espigas começam a secar, depois de secas elas viram para baixo e são colhidas (quebra do milho) e jogadas na bandeira (monte de milho), as espigas que cresceram deformadas ou que não granaram (restolhos) ficam nos pés e mais tarde servem como alimento aos animais ou para forragem (palha do milho). No paiol, o milho é guardado para o ano todo, serve como alimento aos animais, inclusive para os ratos que fazem a festa, por isso vemos muitos deles cercados a zinco ou suspensos para se evitar os ditos ladrões, que dado a boa alimentação chegam a grandes proporções, de onde deriva a expressão: -Parece rato de paiol! Pensando bem nem só os ratos roubam milho, na roça as capivaras fazem estrago, bem como alguns gatunos que não se controlam ao passar diante do milharal verdinho e no ponto para uma boa pamonha.
Após debulhado, o milho pode ser umedecido e socado no pilão com um pouco de cinzas para se tirar o miolo (coração) e se preparar a canjica. Para a farinha seu miolo é retirado no monjolo e colocado de molho por cerca de uma semana, em seguida volta para o monjolo onde é socado até ficar bem moído, depois é peneirado sobre o forno quente formando os bijus e conseqüentemente a farinha de milho, esta mesma massa pode ser acrescida de açúcar e ovos e ser assada em pequenas porções, dando origem as orelhas de padre. Mulheres que usam saias e deixam aparecer as bordas do saiote, segundo dito popular, estão vendendo farinha.
Além de todas as utilidades, o milho é referencia nos negócios, quando se quer vender um bom frango, carneiro ou cabrito, se diz: -O bicho é criado no milho!. Ou ainda para se saber se o compadre tem ou não o dinheiro para pagar alguma coisa, pergunta-se se tem ou não o milho na mão. Bem, mas o grão do milho não é tudo, tem ainda os cabelos que servem como diuréticos, os sabugos usados como rolhas, para se fabricar brinquedos, lavar as orelhas ou tirar encardido dos pés e a palha que além de forragem, são selecionadas a dedo para se fabricar um bom cigarrinho. Na atualidade o milho é utilizado como auxilio na manufatura de fios, no fabrico de óleos, amido, goma, xarope, papel, cola e na industria têxtil e alimentícia. Dado a tantas utilidades, o milho alimentou por séculos as gerações caipiras, juntamente com a mandioca e o feijão, garantindo a sobrevivência dos povoados distantes da costa. Bendito seja o milho e o Grande Espirito (Nhandeiara) que fez brotar do guerreiro Avanti esta preciosa planta. O guerreiro que matou Avanti morreu a seu tempo, porém o herói da história foi o guerreiro vencido, que continua vivo, renascendo em cada plantação, em cada roça de milho.

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